2 de março de 2010

P'ra onde eu for II

pra onde eu for
tudo será novo
um mundo acabado de criar
com meia dúzia
se seres parecidos
e mais uns quantos
muito diferentes
e
novas montanhas
para escalar
rios para atravessar
pedras rolantes
do cimo dos montes
perigosas de morte
para fugir
e haverá bichos
bichos para caçar
peles necessárias
para tapar o frio
que só se conseguem
lutando
e
fugiremos para as cavernas
guardando o saque
que dá poder
e lutaremos
com o peito
com as mãos
com os dentes
com as unhas
mas sim
lutaremos
a chuva cairá
dias a fio
granizo do tamanho de punhos
e o sol
queimará
o que restar da chuva
e muito para além disso
e
cada vez haverá menos
de nós
só os mais fortes
sobreviverão
não inventaremos
regras
nem leis
nem mais nada
que a violência
então
tudo estará em mim
e
terei finalmente
BRINQUEDOS

3 comentários:

  1. Para onde tu fores
    encontrar-te-ei um dia
    e subiremos os montes
    de mãos dadas
    e correremos nas planicíes
    como novamente crianças.

    Vais construir de novo
    um carro de esferas
    para eu me sentar e andar
    sem preocupações
    porque já não me posso magoar.

    Para onde tu fores
    as árvores estarão
    sempre vestidas
    porque não existe
    verão ou inverno
    é sempre primavera.

    Para onde fores
    espera por mim
    porque te irei procurar
    e sei que tu
    estarás à minha espera...

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  2. Inscrição

    Quem se deleita em tornar minha vida impossível
    por todos os lados?
    Certamente estás rindo de longe,
    ó encoberto adversário!

    Mas a minha paciência é mais firme
    que todas as sanhas da sorte:
    mais longa que a vida, mais clara
    que a luz no horizonte.

    Passeio no gume de estradas tão graves
    que afligem o próprio inimigo.
    A mim, que me importam espécies de instantes,
    se existo infinita?

    Cecília Meireles, in 'Retrato Natural'

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  3. Poema para Iludir a Vida

    Tudo na vida está em esquecer o dia que passa.
    Não importa que hoje seja qualquer coisa triste,
    um cedro, areias, raízes,
    ou asa de anjo
    caída num paul.
    O navio que passou além da barra
    já não lembra a barra.
    Tu o olhas nas estranhas águas que ele há-de sulcar
    e nas estranhas gentes que o esperam em estranhos portos.
    Hoje corre-te um rio dos olhos
    e dos olhos arrancas limos e morcegos.
    Ah, mas a tua vitória
    está em saber que não é hoje o fim
    e que há certezas, firmes e belas,
    que nem os olhos vesgos
    podem negar.
    Hoje é o dia de amanhã.

    Fernando Namora, in "Mar de Sargaços"

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